Luis Fabiano, o homem que vem de longe
SUA INFÂNCIA NO BRASIL
– Como você começou a jogar futebol?
No Brasil, o primeiro presente é uma bola. Comecei pequeno com a bola nas mãos sempre querendo jogar, mas até os 14 anos eu não tinha muita intenção de ser jogador. Comecei jogando em um campinho no meu bairro e o treinador falou que eu poderia vir a ser um verdadeiro jogador de futebol. Mais tarde, fiz um teste no Guarani, mas como tinha muita gente não deu certo, não tive a possibilidade de continuar. Fiquei quieto por um tempo, depois fiz um outro teste no Ituano e fui para a Ponte Preta, onde tudo começou.
Seu ídolo: Romário
[photo=pontepreta.jpg id=366 align=right]– Alguém de sua família já jogou futebol? Você tem um ídolo?
Sim, meu avô jogou no profissional da Ponte Preta e no Vasco como lateral. Meu ídolo? Romário. Em 94, quando eu tinha 14 anos, eu já entendia um pouco mais de futebol. Eu achei que ele jogou muito bem na Copa do Mundo. Por que o Romário? Sempre o admirei como atacante, dentro da área, seu caráter, sempre olhando para cima, sempre o admirei. No inicio, eu não era atacante, jogava como meio direita.
– Você assistia os jogos da Ponte Preta?
Minha família toda torcia para a Ponte Preta e eu sempre ia nos jogos.
– Como foi sua infância em Campinas?
Minha infância foi tranqüila. Todo mundo em minha casa trabalhava. Minha família não era rica, mas todos trabalhavam. Era uma família de classe média/baixa. Meu avô era chefe de seção em uma empresa de peças para tratores. Meu tio trabalhava no exército. Minha mãe trabalhava como professora em uma escola infantil. Eu só ia na escola para jogar bola. Para atingir o nível que eu queria, tinha que ter determinação. Tive muita dificuldade em minha carreira, mas nunca desisti.
– Se você não tivesse escolhido o futebol, qual seria sua profissão?
Eu nunca pensei nisso antes. Eu sempre gostei de futebol, mas não sabia que iria ser um jogador profissional um dia. No Brasil é muito difícil se tornar jogador; todo brasileiro quer ser jogador, mas é difícil porque tem muita gente, muitos meninos, muita competição.
– Você se lembra de sua primeira bola? E de sua primeira camisa?
Sim, era uma bola de plástico. Eu gostava de brincar chutando-a contra a parede.
Minha primeira camisa? Da Ponte Preta. Mas a camisa nem era minha, era do meu tio. Quando eu era pequeno eu era muito magro e a camisa ficava muito grande. Joguei tanto com ela que no final não podia mais vestí-la.
“Não gosto de me expor"
[photo=saopaulo.jpg id=366 align=right]– O futebol representa uma progressão social para você? Quais eram os seus objetivos com o futebol?
Meu primeiro objetivo era ser jogador profissional. Quando consegui, comecei a pensar na possibilidade de jogar em um grande time. Depois de ter jogador no São Paulo FC, queria jogar na Seleção. Passo a passo… Ganhar muito dinheiro? Não. Quando começamos em um time pequeno, não pensamos em ganhar muito dinheiro, mas só o suficiente para ajudar a família. Começamos a pensar em dinheiro quando jogamos em times grandes.
– Você tem uma fama de jogador misterioso. Você protege sua vida de propósito?
Sou muito tranqüilo. Tenho filhos; procuro ficar mais em casa; é difícil eu sair sozinho. Não gosto de me expor muito, não gosto de polêmicas. Nunca aconteceu este tipo de coisa em minha carreira. Tenho duas filhas: Giovanna e Gabriela, que têm 2 e 5 anos. Elas gostam de vir nos jogos e entrar em campo comigo.
– O futebol é sua razão de viver ou só um emprego?
Eu gosto de futebol. É minha paixão. E trabalhar com o que gostamos é ainda melhor.
A EUROPA
[photo=rennes.jpg id=366 align=right]– Que lembrança você tem do Rennes, seu primeiro time europeu?
Naquela época eu ainda era muito jovem, tinha 18 anos, e não estava preparado para jogar na Europa. Se não deu certo foi minha culpa, pois eu ainda não estava pronto para enfrentar as dificuldades que tive. Eu tinha somente 3 anos de experiência com futebol, pois comecei na Ponte aos 15 anos.
– É difícil se adaptar ao futebol europeu?
Não consegui me adaptar naquela época nem com o idioma, nem com o frio. Eu só pensava em voltar para o Brasil. As dificuldades que tive com o clima, com o idioma, não me davam vontade de continuar. O estilo de jogo era bem diferente, era muito mais rápido. O futebol brasileiro é muito mais tranquilo e sem contatos físicos. Foi muito difícil mudar meu estilo. Porém, o treinador sempre me colocava em minha posição no Rennes.
– Você ainda mantém contato com o Severino Lucas?
Sim, ele está no Japão. Ficar com ele no Rennes me ajudou, assim como com o Vander e o Cesar. Para mim foi muito importante ter companheiros naquela época. A gente sempre estava juntos. Mas eles também tinham algumas dificuldades, assim como eu.
– Depois deste período difícil, foi complicado voltar a jogar no Brasil?
Não. Voltei ao Brasil para jogar no São Paulo. Cheguei em um time muito bom, me senti novamente feliz jogando bola, e consegui jogar bem quando voltei. Se não tivesse dado certo, eu teria que voltar para o Rennes, e acho que não teria muitas outras oportunidades de jogar novamente no Brasil. Não sei se neste caso eu voltaria por vontade própria para o Rennes. Como tudo correu muito bem no São Paulo, o clube me comprou. Esta foi uma grande arrancada em minha carreira. Graças a isso joguei na Seleção.
– Muitos jogadores voltam para o Brasil hoje. Esta é uma solução?
Depende. Acredito que ajuda; é uma alternativa muito boa para reencontrar a família, o clima. Dependendo do caso pode ser uma boa alternativa.
[photo=porto.jpg id=366 align=right]– Depois você foi jogar no Portugal. Foi mais fácil para você, como brasileiro?
Foi mais fácil, mas apesar de falarmos todos português, portugueses e brasileiros são meio ciumentos em relação ao futebol. O Portugal é um lugar mais tranquilo de se viver. Em termos de caráter, somos diferentes: o português é mais sério, e para os brasileiros tudo é festa. No Portugal não deu certo por outros motivos. Minha mãe foi seqüestrada, durante dois meses. Eu estava no Portugal e não podia voltar ao Brasil, até porque isso não iria facilitar as coisas. Eu vivia só com noticias, de longe. Era muito difícil quanto eu ficava sem notícias, sem nada. Ainda tenho medo disso hoje. O reencontro foi muito bom, muito alegre. Ela estava bem, não estava machucada.
“Estar em Sevilha é como estar em casa"
– O que você acha do futebol espanhol?
É parecido com o futebol brasileiro. Apesar de na Europa o ritmo ser mais rápido, aqui na Espanha os jogadores gostam de conservar a bola. Isso é bom para os brasileiros. Aqui me sinto muito bem. Sevilha é um lugar muito bom para os brasileiros. O clima é quente, me sinto em casa depois de 5 anos. Hoje, é meu segundo país.
[photo=seville.jpg id=366 align=right]– Del Bosque propôs a Nenê de jogar com a seleção espanhola. O que você faria em seu lugar?
É difícil dizer (ele pensa). Mas eu entendo se ele aceitar. Todos os jogadores querem jogar na Copa do Mundo. Como com a Seleção Brasileira é muito difícil, se ele tem a possibilidade de jogar com outra Seleção, eu entenderia. Mas pessoalmente não sei se aceitaria. Não, não iria aceitar mesmo!
A SELECÃO
– Você se lembra de sua primeira Seleção?
Em minha primeira convocação tinha os melhores: Ronaldinho, Ronaldo… Todos campeões do mundo em 2002. Foi difícil para mim encontrar meu espaço. A Seleção de hoje é muito unida, é o que faz a diferença.
– A primeira Copa do Mundo que você assistiu foi aquela de 94 nos Estados Unidos…
Sim. O que me marcou foi o gol do Romário contra o Camarões quando ele chutou por baixo do goleiro. Foi um jogo difícil, mas ele fez a diferença. Eu acompanhei esta Copa com meus amigos, tranquilamente, sem bagunça. Não sou supersticioso mas sempre entro no campo com o meu pé direito.
– Os especialistas criticaram muito aquela Seleção…
– Gostei muito daquela Seleção porque o Brasil venceu e foi campeão do mundo. Eles foram tetra-campeões! O mais importante para mim é vencer.
– Como você se sentiu em sua primeira convocação para jogar com a Seleção Brasileira? Você ainda tem aquela camisa ?
Primeiramente, fiquei muito feliz, claro. Mas sinceramente, eu fiquei sobretudo estressado depois. Eu estava ansioso antes do jogo, pois era o meu primeiro. Antes do início da partida, foi terrível. Todo mundo me ajudou. Na Seleção, o grupo sempre te apóia. Minha primeira camisa? Sim, a guardei. Está no Brasil, na parede de minha casa.
[photo=selecao.jpg id=366 align=right]– Sete anos depois, você ainda sente o mesmo fervor antes de jogar uma partida com a Seleção?
– Sim, isso sempre é algo especial para mim. Vestir a camisa brasileira é uma coisa forte. Tem poucas pessoas que têm esta oportunidade, esta sorte. Representar o povo brasileiro é uma coisa importante. Por outro lado, a pressão é grande. O Brasil sempre tem que vencer. Temos sempre que cultivar pensamentos positivos. Vestir a camisa brasileira, é uma pressão e uma responsabilidade muito grandes.
– Sua família segue sua carreira?
– Eles não estão acostumados a me ligar antes dos jogos. Geralmente, eles me ligam depois para saber como foi o jogo. Minha mãe nunca assiste os jogos, ela é ansiosa demais. Ela tem medo que eu me machuque. Um dia, saí do campo machucado, com convulsões durante um jogo Palmeiras-Ponte Preta. Tive que sair com a ambulância. Depois disso, é sempre muito difícil para ela assistir um jogo.
“Jogar contra a França é sempre difícil"
– O que você fez durante a Copa de 2006 ? Como você acompanhou o torneio?
– Assisti os jogos normalmente, na televisão. Sinceramente, não esperava ser convocado mesmo estando bem no Sevilha. Cheguei muito tarde, não participei da preparação da Seleção.
– Por que o Brasil não consegue ganhar da França ?
– (Ele sorri) Com Zidane, era impressionante. Jogar contra a França sempre foi difícil.
– O que você acha do Dunga ?
[photo=sambador.jpg id=366 align=right]- É uma pessoa boa, é muito tranqüilo. Ele conversa muito com os jogadores, deixando-os a vontade. É um bom treinador; ele é diferente do que as pessoas acham. É uma pessoa muito boa.
O Dunga é muito tranquilo, não gosta de polêmica, de maus comportamentos. Ele sempre explica o como e o porquê, não é rígido apesar de ter muita disciplina.
– Suas instruções sempre parecem estritas. Com ele, nós vemos alguns atacantes da Seleção defender e ir ao contato…
– Essa é sua maneira de dirigir o time e de treinar. Ele insiste muito na marcação para não deixar o adversário jogar. O Brasil precisa conservar a bola para jogar bem. É por isso que o Dunga insiste na marcação para recuperar a bola rapidamente. Sem a bola é diferente, o Brasil não gosta de subir, ele sofre.
“Vou descobrir como é uma Copa"
– Como você vê a próxima Copa do Mundo?
– Agora vou ver uma Copa de outra maneira. Vou jogar! Não sei como que vai ser. Estou na expectativa de ver como tudo vai acontecer.
– Como artilheiro da última Copa das Confederações, a marcação sobre você vai ser forte ..
– Sim, mas é normal. Estou pronto, estou preparado. Todos os times que jogam contra o Brasil marcam forte. Temos que buscar alternativas. Se quero ser o artilheiro da Copa? Não. Claro que seria um sonho, mas não quero pensar nisso, vou deixar as coisas acontecerem naturalmente.
– Com que tipo de jogador você gosta de atuar no ataque? Adriano? Robinho?
– Estou acostumado a jogar com jogadores que se movimentam bastante, com jogadores que têm um estilo parecido ao meu. Mas sempre tento me adaptar. Não tenho preferência. Me entendo muito bem com o Robinho, o Nilmar… Sinceramente, não tenho preferência. Sempre me entrosei bem com qualquer colega. Não tenho favoritos.
“Na Europa, meu estilo de jogo evoluiu"
– Como você descreve seu estilo de jogo ?
É difícil me comparar com outros jogadores, mas eu me considero completo. Na Europa, aprendi muito a marcar e a me movimentar. No Brasil, trabalhei menos estes aspectos. Na Europa tudo é físico. Sem isso, não é possível jogar na Europa.
– Qual é seu prognóstico para o Mundial de 2010 ?
– (Risos) Campeão do mundo (levantando os braços)! Seria ótimo!
– Você vê uma final contra a Espanha ?
– Cuidado com a França e a Argentina!
– Na Seleção sempre tem uma forte concorrência. O que une os jogadores?
– Quando estamos juntos, sempre falamos da gente, do time. O importante para nós é a Seleção. Sempre respeitamos o adversário. Se o Brasil está bem, se os jogadores estão bem, já é 80% do resultado. Os 20% restantes? Trabalhar no campo. A camisa não faz mais a diferença.
A força do Brasil é a união entre os jogadores. O Dunga nos ajuda muito. O Brasil é forte por isso: o Dunga nos transmite esta força e este caráter para vencer.
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