Andrade foi um cabeça-de-área no tempo em que cabeça-de-área sabia jogar futebol. Porque houve esse tempo, acreditem ou não, e não é um tempo tão longínquo assim. Em 81, Andrade foi campeão mundial de clubes, em Tóquio, integrando o grande time do Flamengo de Zico, Leandro, Júnior, Adílio & Cia. E era mesmo um tempo em que os cabeças-de-área também sabiam jogar futebol.
Tanto sabiam, e eram tantos, que Andrade mal conseguiu chegar à seleção brasileira. Teve poucas oportunidades em tempos de Falcão, Cerezo e outros.
Mas Andrade sabia jogar muito bem , fazia tudo o que se faz hoje, marcava, combatia e, melhor ainda, tomava a bola dos adversários sem desferir patadas nem coices, sem fazer faltas, o que lhe permitia transformar o ataque do adversário em forte contra-ataque do seu time. Andrade não errava passes.
Hoje, é técnico do mesmo Flamengo. Discreto, calado, modesto. Sabe perfeitamente avaliar a capacidade dos jogadores de meio de campo de hoje em comparação aos de seu tempo, sabe que o padrão caiu demasiadamente, mas, indagado a respeito, responde em voz baixa, lacônico:
— Mudou muito… mudou muito…
Mudou mesmo. Não se fazem mais cabeças-de-área como antigamente. Aliás, nem só cabeças-de-área. Não se fazem mais jogadores de meio de campo como antigamente. Os armadores, cérebros do time, maestros como Gérson e Didi também desapareceram.
A primeira exigência, antes, era saber jogar. Depois, sim, marcar, combater, impedir o adversário de jogar. Mas a primeira, a primeiríssima exigência era jogar. Hoje, é o contrário. Primeiro, marcar, combater, fazer falta. E, por isso, o meio de campo do Flamengo, que antes tinha Andrade, hoje tem Da Silva.
E é com Da Silva que o técnico Andrade vai ter que se virar. Talvez seja por isso que, ao assumir, ele diz que seu desafio agora é muito maior do que como jogador, em Tóquio, em 1981.
E é mesmo: reerguer um Flamengo que, em vez de disputar título mundial em Tóquio, luta para não ser rebaixado em campeonato nacional no Brasil