Túlio Maravilha, craque dos anos 90: “Naquela época, a gente tinha ídolos. Hoje, a gente não tem”

Em entrevista exclusiva ao Sambafoot, o eterno ídolo do Botafogo fala de superação, dos polêmicos mil gols e do que pensa sobre o atual futebol brasileiro
2022-02-17 12:27:48

Túlio Maravilha é uma das figuras mais irreverentes do futebol brasileiro. Eterno ídolo do Botafogo, viveu seu auge com a conquista do Campeonato Brasileiro de 1995 e coleciona artilharias por onde passou.

Na reta final da sua carreira, protagonizou a saga dos mil gols e, pelas suas contas, atingiu o seu objetivo em 2014. Seguiu em atividade até seus quase 50 anos de idade e vestiu a camisa de mais de 30 clubes ao redor do mundo.

Nesta entrevista exclusiva ao Sambafoot, o ex-camisa 7 fala sobre a sua história no Botafogo, comenta a fase atual da Seleção Brasileira e revela alguns casos engraçados da sua carreira. Confira!

Sambafoot: Todo mundo te conhece como o eterno ídolo do Botafogo. Além disso, você foi artilheiro três vezes do Brasileirão, tem a marca dos mil gols e tantas outras conquistas. Mas vamos falar sobre o início da sua carreira. Como foi esse começo, lá em Goiânia? E quais pessoas te marcaram nessa época? 00:01:20

Túlio Maravilha: Para quem não sabe, eu sou de Goiânia, capital de Goiás. Todas as minhas categorias de base foram feitas no Goiás Esporte Clube, apesar de ser ídolo e ter identificação maior pelo Botafogo. Mas foi no Goiás onde tudo começou. E graças ao meu pai, que foi meu grande incentivador, meu grande inspirador e motivador para que eu pudesse me tornar jogador de futebol. Ele me levava aos jogos do Vila Nova, que era justamente o rival do Goiás, para que eu pudesse assistir aos jogos. E isso foi durante toda a minha infância, desde os oito anos de idade até os doze. E isso me despertou essa paixão pelo futebol, e um dia eu falei pra ele: "Pai, está vendo esses jogadores aí no campo? Um dia o senhor vai ter o orgulho de me ver também jogando futebol aqui no Serra Dourada e vai ser uma alegria inenarrável." Graças a Deus eu pude realizar esse sonho enquanto ele ainda estava vivo e ele foi o grande responsável.

A partir daí, nas categorias de base do Goiás, eu passei por todas as provações. Não foi fácil para um menino da base se firmar em uma equipe grande do estado de Goiás. Com muita garra, superação e muito treinamento, graças a Deus eu cheguei a ser profissional e, logo no segundo ano, em 1989, já fui artilheiro do Campeonato Brasileiro com apenas 20 anos.

Sambafoot: Você teve três passagens pelo Botafogo, mas a primeira foi a mais marcante. Quais foram os momentos que ficaram guardados na memória dessa época do Botafogo? 00:03:28

Túlio Maravilha: Quando eu cheguei, em 1994, o time praticamente ressurgiu das cinzas, né? Não tinha nem centro de treinamento, não tinha uma sede digna. Com a minha chegada, em 1994, eu já cheguei como uma grande promessa de virar ídolo e resgatar aquela paixão adormecida do torcedor botafoguense.

Logo no primeiro ano, já fui artilheiro do Campeonato Carioca, fui artilheiro do Campeonato Brasileiro e, mesmo com dificuldades financeiras, a gente conseguiu fazer uma boa campanha naquele ano.

Já em 1995, aí sim, o time veio com mais jogadores experientes, veio com patrocinador forte na época, a Seven Up, que era uma subsidiária da Pepsi, e com esse grande patrocínio tudo mudou no Botafogo. A começar pelo meu número. Eu jogava sempre com a 9 e passei a jogar com a número 7 por causa do Seven Up.

Deu tudo certo naquele ano mágico, o Botafogo foi campeão brasileiro. Aliás, bicampeão! Havia sido campeão em 1968, olha quantos anos se passaram. E eu fui mais uma vez artilheiro e campeão. Então foi um ano inesquecível, mágico. Como você falou, esses três primeiros anos no Botafogo foram fundamentais. A partir dali nasceu o Túlio Maravilha.

Sambafoot: Você já disse que se arrepende de ter saído do Botafogo para ir para o Corinthians, em 1997. Depois passou também por Fluminense, Cruzeiro, entre tantos outros. Por que você acha que não deu essa mesma liga com outros times como deu com o Botafogo? Acha que foi o momento, os técnicos ou alguma outra coisa? 00:05:20

Túlio Maravilha: São vários fatores. Eu estava no Botafogo há três anos consecutivos sendo artilheiro e campeão. Já tinha essa marca, essa idolatria. Ficou muito forte a minha imagem junto ao Botafogo.

Quando eu resolvi sair do Botafogo… É por isso que eu falo que, se pudesse voltar ao tempo, porque a gente não tem bola de cristal, eu não ia poder prever que no Corinthians, no Cruzeiro e nesses outros clubes, Fluminense, eu não ia ter o mesmo sucesso que a gente teve no Botafogo.

Lá, eu já tinha a minha identidade. Nos outros clubes, eu tive que começar tudo do zero. Resgatar, conquistar meu espaço com novos jogadores, novos treinadores, que tinham uma mentalidade diferente. No Botafogo todo mundo já sabia a minha característica. Era ficar ali na frente para que o time pudesse jogar em minha função.

Infelizmente, nos outros clubes eu não tive essa sorte e esse sucesso, justamente por essa inconstância de jogadores que se acostumaram a ver meu jogo, minha maneira de jogar. Isso foi meu grande arrependimento, mas a gente não tem bola de cristal.

O importante é que, por onde a gente passou, deu muitas alegrias aos torcedores.

Sambafoot: Antes de jogar no Botafogo, você jogou no Sion, da Suíça, e passou duas temporadas lá. Conta pra gente como foi esse período na Europa, um lugar completamente diferente do que você estava acostumado em Goiás. Você falou em uma entrevista que pensou até em desistir de jogar. 00:07:07

Túlio Maravilha: Imagina trinta anos atrás, quase quarenta, um jovem atleta sair do centro do Brasil, de Goiás, para um país de primeiro mundo, que era a Suíça. Naquela época não tinha internet, não tinha essa facilidade que a gente tem hoje. Quando você vai pro país, sabe o que vai encontrar lá, os costumes, os hábitos, a alimentação. E, naquela época, não tinha nada disso, a gente foi com a cara e a coragem.

Na verdade, eu fui para jogar na França e até brinco: eu dormi em Paris e acordei na Suíça. Porque o objetivo era ser vendido para o Paris Saint-Germain (PSG), mas eles não me conheciam, não tinha internet. Então eu tive que fazer um teste de última hora para o treinador me conhecer.

Eu já estava de férias há quase um mês, sem treinar e sem ritmo nenhum. Mesmo assim, me colocaram para jogar uns trinta, quarenta minutos e não fui aprovado. São destinos do futebol, né?

Hoje, em qualquer peladinha de rua todo mundo já te conhece e sabe se você pode ser contratado ou não. Aí fui parar na Suíça, um lugar que não tinha nada a ver com futebol. Naquela época [o futebol] era semi-profissional, só treinava de manhã e ficava o dia inteiro à toa. Era um frio de -15ºC, -17ºC, foi uma adaptação muito ruim, muito difícil. Meus filhos, à época, não se adaptaram à língua. Tinha o francês, o italiano, o alemão, foi uma confusão danada.

Eu já queria voltar no primeiro ano, mas o presidente disse que eu tinha que ficar e cumprir o contrato. Por isso essa baixa estima, esse meu desespero. "Vou voltar, mas quando voltar não quero mais saber de futebol, estou desiludido, quero encerrar a carreira." Isso com 23 para 24 anos.

Mas graças a Deus, antes de terminar o contrato, surgiu essa oportunidade de voltar ao Brasil, especialmente para o Botafogo. Aí sim mudou tudo. Ficou para trás o Túlio do Goiás e da Suíça para virar o Túlio Maravilha do Brasil.

Sambafoot: Falando ainda sobre futebol europeu, por um lado você se arrepende de não ter tentado jogar mais por lá? 00:09:54

Túlio Maravilha: Na verdade o que deveria ter acontecido era ter saído do Goiás e ter ido para um clube grande na época, como o Botafogo ou um clube de São Paulo. Eu tive várias propostas. O Internacional tentou me contratar, mas naquela época existia a Lei do Passe, não do jogador. A gente só tinha direito a 15%, olha a dificuldade, era praticamente um jogador escravo. A gente tinha que obedecer as preferências do time e não a sua. A minha vontade era poder escolher, esse era o objetivo, o caminho normal: sair do Goiás, ir para um clube grande do Rio ou São Paulo e depois ser vendido para a Europa. Mas fiz o inverso; saí de um clube médio direto para a Europa, para um clube de menor expressão.

Se fosse pelo menos França, Itália ou Espanha, eu poderia ter um sucesso maior. Mas fui justamente cair na Suíça, que era um futebol mediano. Eu nunca corri tanto na minha vida como na Suíça. Porque lá o futebol é, praticamente, o segundo esporte, o que eles mais praticam é o ski. Só para você ter uma ideia.

Sambafoot: Vamos falar agora da sua saga dos mil gols, que você chegou em 2014, pela sua contagem, jogando no Araxá. Pelé e o Romário já tinham chegado a essa marca anteriormente. Como começou a ideia do Túlio Maravilha também conquistar os mil gols? 00:11:23

Túlio Maravilha: Na verdade, o primeiro foi o Pelé, né? Em 1969, justamente no ano em que nasci. Eu estava acabando de vir ao mundo e o Pelé já estava fazendo o seu milésimo gol na carreira.

Mas não foi a partir daí, foi a partir do Gol 500, que eu fiz com a camisa do Cruzeiro, jogando no Campeonato Mineiro, em 1999. Era justamente o ano do descobrimento do Brasil. Nos 500 anos do descobrimento do Brasil eu tive a felicidade de fazer 500 gols na carreira.

A partir dali eu imaginei: "Quem sabe daqui a dez anos eu não possa chegar a tão sonhada marca do Rei Pelé, do milésimo gol". Foi ali que me deu o start desse objetivo. Claro, tivemos muitas dificuldades, eu já estava com mais de 30 anos. Naquela época, o jogador era considerado em fim de carreira e a gente não tinha a medicina esportiva que a gente tem hoje.

Então foi muito demorado, foi muito desgastante chegar até 2014, com quase 45 anos, nessa marca histórica. Antes veio o Romário, que só me deu mais combustível ainda. Eu falei: "Agora eu vou ser o terceiro da história a também chegar a essa marca". Graças a Deus, com todas as dificuldades, com todos os sacrifícios, barreiras e superações, a gente conseguiu.

Eu queria fazer no meu clube de coração, o Botafogo, mas não foi possível na época. Aí surgiu a oportunidade de o Araxá Esporte Clube fazer com que eu pudesse chegar ao milésimo gol.



Sambafoot: Vamos falar de alguns dos seus gols mais marcantes e polêmicos. Tem o gol contra a Argentina, o "Mão de Deus", e aquele de calcanhar contra o Chile. Mas é verdade que o seu favorito é o do Brasileirão de 1995, contra o Santos? 00:13:35

Túlio Maravilha:

O [gol] do Botafogo em 1995 contra o Santos foi o mais importante, porque ali foi a consolidação, foi a consagração da minha história com a camisa do Botafogo.

Porque eu tinha sido artilheiro de várias competições, mas sempre tinha aquele questionamento: "E o Túlio, não vai dar um título? Não vai ser campeão? É sempre artilheiro, mas título que é bom, nada".

Então aquele ano foi fundamental. Aquele gol contra o Santos, no Pacaembu, é que realmente carimbou a minha passagem pelo Botafogo e pelo futebol brasileiro. Por isso, eu considero aquele gol como o mais importante da minha carreira, senão um dos mais importantes da história do clube. Porque já vai fazer 26 ou 27 anos que o Botafogo não é campeão brasileiro.

Sambafoot: Você já falou várias vezes sobre como o VAR vem atrapalhando o futebol. Você acha que teria chegado aos mil gols se existisse o VAR naquela época, quando começou a jogar? 00:14:47

Túlio Maravilha: Eu poderia ter chegado e também não ter chegado. Naquela época, eu tinha feito vários gols que o bandeirinha dava impedimento e não era impedimento. Dava gol no que não era falta. Deixava de marcar pênalti e vice-versa também. De repente vários gols meus foram impedidos, vários gols meus foram irregulares. Então eu acho que poderia ajudar tanto para cima como para baixo. Mas hoje, com certeza, a facilidade que os jogadores hoje têm de fazer gols e anular gols é muito maior. Então acredito que poderia chegar sim. Era só questão de tempo e adaptação.

Sambafoot: Essas histórias sobre seus gols e muitas outras estão registradas na sua biografia recém-lançada, escrita por Wilson Rossato, intitulada "Mil vezes Túlio Maravilha". Tem algum spoiler para dar, alguma história que ninguém ou quase ninguém conhece do Túlio Maravilha? E onde comprar o livro? 00:15:58

Túlio Maravilha: A gente lançou, no final do ano passado, o "Mil vezes Túlio Maravilha", juntamente com a Editora Zit aqui do Rio de Janeiro. Para quem quer comprar o livro, é só entrar no site www.fokaki.com.br e você adquire lá. Hoje em dia é tudo virtual, né? Você compra e recebe em casa em um ou dois dias. Uma coisa bem moderna e prática. A gente lançou agora no final do ano, no mesmo dia em que eu fiz meu jogo de despedida com a camisa do Botafogo, no dia 11 de dezembro.

Tem várias histórias, principalmente de bastidores. Todo mundo conhece essa vida de jogador, com viagens, clubes grandes, faz gols, é campeão, tem derrotas. Mas não sabe o dia a dia, não sabe os bastidores.

Vou contar uma passagem rápida quando eu joguei no Vila Nova de Goiás, em 2001. Eu não era ainda casado com a minha segunda esposa, ainda estávamos namorando, nos conhecendo. Nas concentrações, quando dava 10 ou 11 horas da noite, o supervisor passava nos quartos, mas o meu companheiro de quarto já sabia toda vez eu tinha que dar uma escapadinha, para poder ficar mais à vontade e namorar a minha esposa, sem que o supervisor soubesse… Então ele fazia tipo um boneco de pano, colocava travesseiro e cobertor. Quando ele (supervisor) entrava no quarto, o meu amigo falava: "Fala baixo, silêncio, que ele já está dormindo. Não acorda ele, senão não vai ter gol amanhã". Depois que ele saía, eles faziam uma corda com os lençóis para que eu pudesse sair pela janela e descer uns dois ou três metros da concentração. Eu pulava o muro e tinha um cachorro do lado que começava a latir. O pessoal falava que, quando o cachorro começava a latir, era porque o Túlio estava indo embora, estava indo namorar (risos). Eu só retornava às 6 ou 7 horas da manhã, primeiro que todo mundo e já tomando o café da manhã para depois dar uma descansada. No jogo, eram dois ou três gols "facinho, facinho" e o bicho era garantido.

Sambafoot: Vamos falar sobre a Seleção Brasileira, onde você teve uma boa passagem, apesar de não muito longa. Estamos em ano de Copa do Mundo. O que você acha da equipe atual, e qual sua opinião sobre a camisa 9, que ainda não tem um dono definido? Desde a Copa da Rússia, não encontramos a camisa 9 que vai ser o titular. E queremos saber se o Túlio Maravilha teria vaga na Seleção de hoje! 00:19:02

Túlio Maravilha: Verdade. Depois de Romário, Ronaldo Fenômeno, Careca… grandes atacantes com a camisa 9, como Reinaldo, Roberto Dinamite. Até eu me coloco nessa também. Acho que o último foi o Fred, em 2014, que não teve aquele brilho e sucesso que a gente esperava. Ali foi uma grande decepção.

A partir de 2014, vai fazer quase oito anos que o Brasil está com esse ponto de interrogação. Quem será o novo camisa 9, aquele homem responsável por fazer os gols das vitórias? O Tite, nesse período, fez várias experiências, vários testes e ainda não encontrou esse camisa 9. Fala-se muito em Firmino, Gabriel Jesus e Richarlison. Mas todo mundo já teve sua oportunidade e não tem aquele cara que, ao lado do Neymar, possa desequilibrar e, quem sabe, dar uma esperança de trazer o hexacampeonato.

Mas hoje, como o futebol mundial está globalizado, não tem aquele camisa 9 raiz. São jogadores flutuantes, então o Tite está tentando, dentro das eliminatórias e dos amistosos, já com a vaga garantida, conseguir o parceiro ideal do Neymar. A gente fica na esperança que, até o final do ano, apareça um Aladim da lâmpada mágica para trazer esse "9". Se fosse eu, com certeza, viu? A minha vaga já estaria garantida. Seria eu e Neymar lá na frente e o resto iria se virar lá atrás.

Sambafoot: O que você está achando do trabalho do Tite na Seleção nos últimos anos? Será que o hexa vem este ano? 00:21:30

Túlio Maravilha: Eu acredito que a gente vai mais longe do que em 2018. A gente perdeu nas quartas de final para a Bélgica e foi uma euforia muito grande, porque tinha feito uma eliminatória muito boa, conseguiu a vaga antecipadamente, a exemplo do que a gente conseguiu esse ano. Antes de acabar as eliminatórias já conquistamos a vaga.

Só que agora o Tite já está mais experiente, mais maduro e sabe como funciona a Copa do Mundo. São três jogos na primeira fase e depois vem o mata-mata. É nesse mata-mata que o Brasil não pode errar. É um detalhezinho que pode colocar todo o projeto e todo o seu trabalho a perder.

Então, eu acredito que, neste ano, [o Brasil] vai ter mais chance. Eu acredito que vai chegar mais adiante e me arrisco a dizer que pode até fazer a final. Vamos torcer para que não encontre um grande adversário nas quartas, nas semifinais, porque tem que ter um pouco de sorte e também competência. Eu acredito que, neste ano, o Brasil vai mais longe.

Sambafoot: Voltando para os anos 90, no auge da sua carreira, tinha uma brincadeira de quem era o "Rei do Rio". Tinham rixas, rivalidade com Romário, Renato Gaúcho, mas era tudo brincadeira. Como era a relação com esses grandes jogadores? Naquela época, eles ainda jogavam aqui no nosso futebol, o que hoje não é tão comum. Você acha que esse tipo de rivalidade ainda cabe no futebol do Brasil? 00:22:58

Túlio Maravilha: Eu acredito que sim. Naquela época, eram grandes artilheiros em cada grande equipe do futebol brasileiro, tanto em São Paulo como no Rio. Se você for pegar, cada um tinha o seu matador, o seu número 10 que desequilibrava. Tinha uma referência.

Por isso, tinha essa rivalidade sadia, uma rivalidade alegre. A gente prometia gols, apostava cestas básicas. O estádio estava cheio, não tinha tanta violência como tem hoje. O que atrapalha muito são essas torcidas organizadas, que só pensam em violência e esquecem de torcer. Hoje, os jogadores ficam até com medo de prometer gols e falar que vão fazer o "Gol Urubu" ou "Gol Bacalhau", porque vão achar que estão menosprezando. Ainda mais com as redes sociais, que as pessoas não usam para o bem, mas para o mal. Fake news…

Teria espaço, mas você teria que ter muita criatividade, muita inteligência para poder brincar com esse tipo de situação e não menosprezar ninguém ou desrespeitar a instituição. Também não sofrer pressão da torcida e do Ministério Público. Eu acho que o futebol ficou com muito "mimimi", muito politicamente correto e sem graça.

Sambafoot: Quais foram os jogadores que você atuou que mais te marcaram? Tanto os que você jogou na mesma equipe como aqueles que você enfrentou. 00:25:12

Túlio Maravilha: Nossa, vamos encher uma mão aqui, viu? Para começar, no Botafogo tinha o Donizete, que era o meu parceiro de ataque em 1995. Fomos campeões brasileiro e ele, dos 23 gols, deve ter dado o passe para uns 15, no mínimo. Porque ele já sabia o posicionamento, a gente já tinha jogadas ensaiadas. Era um cara fantástico, jogava no lado direito e esquerdo, cruzava super bem e ainda fazia gols. O Donizete foi o melhor parceiro de ataque que eu tive.

Depois ainda tive a honra de poder jogar ao lado do Bebeto, no Vitória da Bahia, no próprio Botafogo. Joguei com o Edmundo na Seleção Brasileira, na Copa América de 1995. Marcelinho Carioca no Corinthians, que foi um dos garçons, o Craque Neto também tive a oportunidade de jogar. No Cruzeiro tinha uma constelação. Muller, Valdo… Enfim, era só fera. Nos anos 90, você fechava os olhos e só tinha craque do seu lado.

Sambafoot: Teve algum jogador que você não jogou junto e gostaria de ter tido a oportunidade? 00:26:36

Túlio Maravilha: Apesar de ter a mesma característica, tanto eu quanto o Romário, eu acho que caberia, de repente, a gente fazer uma dupla de ataque, né? A exemplo de Bebeto e Romário, Bebeto e Túlio.

Eu também joguei com o Ronaldo Fenômeno em 1995, ele estava começando e a gente fez algumas partidas juntos também. Ali, a gente já sabia que ia virar um dos melhores jogadores do mundo. Eu acho que jogador bom joga em qualquer lugar e com qualquer um do seu lado.

Sambafoot: Na sua opinião, qual é a grande diferença entre o futebol de hoje e o futebol dos anos 90? Você acha que falta amor à camisa nos jogadores de hoje, falta comprometimento? O que você considera a principal diferença? 00:27:26

Túlio Maravilha: A principal diferença é a questão técnica. Vamos ser bem claros e bem objetivos. Como eu falei, nos anos 90 e até nos anos 2000, a gente tinha clubes recheados de craques, recheados de foras de série. Tanto no ataque, meio-campo e até na zaga. Hoje não, você conta nos dedos um ou dois jogadores que são a referência. Naquela época, a gente tinha ídolos, hoje a gente não tem.

Tirando Palmeiras, Flamengo e agora o Atlético Mineiro, são as três equipes que estão com jogadores de nome, jogadores experientes e que já conquistaram quase tudo na carreira. Mas os demais precisam correr atrás, revelar novos atletas. E quando começa a revelar, vende para o exterior. O garoto não tem condições de ser campeão e artilheiro pela sua equipe. O torcedor nem decora o nome dele. Essas são as grandes diferenças. Falta qualidade técnica. Não digo amor à camisa, mas falta mais tempo de casa para que o torcedor possa se acostumar com o novo ídolo.

Sambafoot: Você foi o único a ser artilheiro nas Séries A, B e C. Falando dos times pequenos no seu final de carreira, quando você fez quase uma maratona pelo Brasil, qual foi o time que mais te surpreendeu positivamente? 00:29:07

Túlio Maravilha: Foi em 2000. Foi a minha última passagem pelo Botafogo e logo em seguida eu fui para o São Caetano. Imagina, o São Caetano estava na segunda divisão do futebol paulista e ninguém ouvia falar dele. Quando eu cheguei no ABC Paulista, a cidade era super moderna, super avançada, com várias empresas ao redor. E um time estruturado, tinha um campo de treinamento, academias. A partir dali, o São Caetano começou a ser visto diferente. Naquele ano, fomos campeões da Série A2, que era a segunda divisão, e eu fui o artilheiro com 20 gols em 20 jogos. Praticamente um gol por partida.

Depois veio 2000 e 2001, foram finalistas da Libertadores, eles também foram vice-campeões do Campeonato Brasileiro contra o Vasco e o Athletico-PR. Eu até brinco que, se eu tivesse continuado, com certeza um desses títulos a gente teria vencido. O Brasileiro ou até a Libertadores. Então, foi uma grande surpresa o São Caetano.

Sambafoot: Qual conselho você daria para jovens talentos que estão começando no futebol brasileiro e sonham em ter uma carreira de sucesso como a sua? 00:30:48

Túlio Maravilha: Primeiro, é você não desistir nunca. Você sabe que o jogador de futebol, 95% é assalariado, enfrenta dificuldade e joga em clube pequeno. Rala para poder ganhar o seu pão de cada dia. Apenas 5% vive no glamour, altos salários, clube grande e tem aquelas mordomias. Então, você que quer estar entre esses 5%, primeiro tem que ter fé em Deus e acreditar que Deus vai cuidar da sua vida, vai te proteger e vai te direcionar em todos os momentos da sua carreira pessoal e profissional.

Segundo, você tem que se dedicar. Não basta ser só um bom jogador, ter talento. "Ah, eu sei chutar, sei fazer gol, sei cruzar". Não, tem que se dedicar. Tem que ser 99% transpiração e 1% de inspiração. Depois, você tem que ter humildade, porque trabalhar em equipe, com seres humanos, não é fácil.

Você tem que ter muita habilidade, tem que ter humildade, respeito e simplicidade. Porque, no futebol, o difícil é você fazer o simples. Quando você começa a inventar, as coisas não dão certo.

Então, não desista dos seus sonhos. Acredite, tenha fé. Se a primeira porta fechou, a segunda, não desista.  Vai em cima, vai em busca até onde você realmente achar que não dá mais.

Esse é o grande desejo, a grande mensagem. E quando você chegar lá, não pense que você é o melhor do mundo. Porque para subir é difícil, mas para cair é rapidinho.

Então, você tem que ter humildade, respeito, gratidão e saber valorizar cada momento da sua vida, para você ter chegado ao sucesso. Esses são alguns exemplos básicos que eu passo, já que eu sou palestrante motivacional. Minha palestra é 100% atitude, é isso que eu passo para a garotada que quer ser jogador de futebol. Não só no futebol, mas também na vida profissional.

Sambafoot: Você encerrou a sua carreira com quase 50 anos de idade. Se pudesse descrever a sua trajetória no futebol em uma (1) palavra, qual seria? 00:33:00

Túlio Maravilha: Superação. Essa é a minha marca registrada. Túlio é aquele Deus Fênix: quando você menos espera, ele ressurge das cinzas e dá a volta por cima! Então essa é minha palavra, é a minha história: superação!

BotafogoPelé1995, final do Campeonato Brasileiro, Botafogo e Santos no Pacaembu. Gol do título!1995, foi onde eu tive a minha consagração total no futebol brasileiro.Taça Guanabara, 1995, contra o Flamengo. Perdemos por 3 a 2 e fui expulso pela primeira vez na minha vida.

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